sábado, 6 de setembro de 2014

TESOUROS, OBRAS DE ARTE E MARAVILHAS


   
View of the Kunstkammer (chamber of art) in Berlin, 1704
http://ansmagazine.com/Winter04/Berlin


Os conceitos de Schatzkammer, Kuntskammer e Wunderkammer aplicam-se a um fenómeno cultural relacionado com o Renascimento e que se pode designar, genericamente, como colecção e exposição de objectos dignos de apreço.

De facto, as mudanças verificadas na estrutura política e social dos países europeus, resultantes dos condicionalismos gerados, primeiro pela afirmação do poder régio e depois pela descoberta e exploração de novos continentes, originaram atitudes culturais inovadoras das elites europeias. O conceito de Schatzkammer (arca de tesouro) aplica-se ao entesouramento de bens móveis, característico da Idade Média mas prosseguido com novos padrões de gosto e de interesses pelas Cortes e aristocracias profanas e eclesiásticas dos séculos XV e XVI – em que se guardam, além do dinheiro vivo, joias, pedras preciosas, iluminuras, tapeçarias, roupas de luxo, mobiliário, etc.

Os conceitos de Kunstkammer e Wunderkammer designam a prática de procura, organização e exposição em espaços restritos de objectos diversificados com o intuito de ilustrar a variedade e a complexidade do mundo conhecido. Se parecem revelar exibição e afirmação de poder e superioridade intelectual dos seus proprietários, também se infere deles o desígnio de instruir e de exaltar o Criador divino pelas obras maravilhosas que pôs à disposição dos homens.

Tem-se usado o termo Kunstkammer para designar um gabinete (pequeno espaço) ou armário (móvel com prateleiras e portadas) em que se mostram curiosidades e objectos estranhos ou raros, de forma organizada e a partir de critérios determinados pelo colecionador, onde se podem encontrar espécimes naturais da flora e da fauna (naturalia), manufacturas (artificialia) ou objectos de povos antigos (antiquitas).

O conceito Wunderkammer (colecção de arte e maravilhas) liga-se preferencialmente à organização e exposição de mirabilia, que vão dos objectos artísticos às relíquias contidas em peças de ourivesaria, das cartas e portulanos raros aos exemplares exóticos do mais diverso teor, trazidos pelos marinheiros e comerciantes nas suas viagens aos novos territórios da África, Ásia e Américas.

É neste ponto que radica a importância dos Descobrimentos portugueses. O contacto com os novos mundos permitiu a recolha e o estudo de exemplares até então desconhecidos nos campos da fauna e da flora, bem como de rochas e de objectos etnográficos exóticos. Outra área importante foi a do desenho cartográfico e astronómico, realizado durantes as viagens marítimas, base da geografia e astronomia modernas. Desenvolveram-se novas práticas de inventariação e classificação, imprescindíveis para o estudo e conhecimento da zoologia, botânica e geologia.

A atitude colecionadora, expressa naqueles conceitos, prefigura o estabelecimento do espírito científico seiscentista e a preocupação enciclopédica característica de setecentos - e está na origem dos museus criados no século XIX – que se constituíram, frequentemente, a partir dos acervos contidos naquelas colecções.

 Torres Vedras, 14 de Abril de 2014

Joaquim Moedas Duarte


BIBLIOGRAFIA DE APOIO:

BRIGOLA, João Carlos (coord.) – Coleccionismo no século XVIII, textos e documentos. Porto: Porto editora, 2009.
FILHO, Durval de Lara – Museu: de espaço do mundo a espaço relacional. [Em linha]. S. Paulo: Escola de Comunicações e Artes, 2006. Dissertação de Mestrado. [Consult. 10-04-2014]. Disponível na Internet:<URL: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27151/tde-30112006-105557/pt-br.php
GSCHWEND, Annemarie Jordan – Catarina de Áustria: Colecção e Kunstkammer de     uma Princesa Renascentista. Oceanos. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, n.° 16 (Dezembro1993), p.62-70.

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